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Três perguntas para Margarida Patriota | Blog da Simone Magno

Simone Magno – O romance juvenil U’Yara, rainha amazona pode ser considerado uma fábula feminista?

Margarida Patriota – Sim, de maneira indireta, pois ao retratar uma comunidade onde as mulheres mandam e desmandam nos homens, de maneira discriminatória, eu satirizo o machismo e o patriarcalismo que durante séculos legitimou (e legitima ainda em certos rincões do Planeta) a opressão da mulher e a usurpação de seus direitos civis, como o direito à educação, ao voto, à participação política. Frise-se que a heroína da minha história almeja implantar na tribo a igualdade de direitos para ambos os sexos, e não a supremacia de um grupo sobre outro. 

Capa Autores e Ideias em BAIXASM – Você acaba de lançar um volume que reúne entrevistas realizadas com escritores brasileiros em seu programa Autores e Livros. De que forma essas conversas influenciam sua literatura?

MP – Sempre aprendo com os autores que entrevisto, sejam eles grandes ou pequenos, conhecidos ou desconhecidos. A incumbência de entrevistar autores brasileiros me obriga a me manter atualizada com o que se publica no país em matéria de poesia, contos, crônicas, ensaios e romances, principalmente. Ao conversar com escritores de origens e regiões diferentes, ganho informações, conhecimentos, lições de persistência e estímulos que acredito enriqueçam minha produção literária.

SM – Com 28 livros publicados, ainda vem uma nova tradução de Henry James. Como é a sua rotina de trabalho?

MP – No café da manhã passo os olhos no jornal Correio Braziliense e me ponho diante do computador de 8h30 às 12h30, uma e outra interrupção telefônica ou de natureza doméstica me tirando do assento de vez em quando. Trabalho à tarde em meus escritos das 14h às 17h, quando não tenho de ir à Rádio Senado gravar entrevistas. À noite, assisto ao noticiário e leio. Sábados e domingos escrevo duas, três horas, de manhã, e leio de tarde outro tanto. Para não entrevar antes da hora, encaixo nessa agenda uma hidroginástica duas vezes por semana, bem como uma aula semanal de espanhol e outra de tênis.

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Livro “U’Yara, Rainha, Amazona” será lançado em Brasilia | Cultura Alternativa

Título aborda emancipação feminina e igualdade de gêneros

São Paulo, maio de 2015 – A história de U’Yara, rainha amazona, publicada pela Saraiva, transcorre na tribo Og, lugar em que as mulheres mandam e os homens obedecem —feitos apenas para realizar tarefas como varrer, limpar e catar piolhos.

 

É neste paraíso para mulheres que nasce U’Yara, uma garota destemida, cheia de boas intenções e ideias pioneiras sobre igualdade, que, para se tornar rainha, vai ter de superar várias adversidades.

 

Um de seus desafios será o de mudar crenças e tradições ultrapassadas. Além disso, ela terá de promover a justiça e a igualdade, pois só assim valerá a pena ser uma rainha amazona.

 

A tarefa se torna mais complicada quando Murumu’Xaua tenta tirar o direito de U’Yara governar.

 

O livro é indicado para jovens a partir dos 14 anos e mostra, com boa dose de humor, a importância da igualdade de gêneros na sociedade.

Sobre a escritora:

Autora de romances, contos e ensaios, bem como de títulos voltados para o público juvenil, Margarida Patriota foi professora da Universidade de Brasília de 1976 a 2003. Desde 1997, comanda o programa Autores e Livros, da Rádio Senado.

Serviço

Cidade – Brasília-DF

Local – LeCalmon Livraria

Endereço – SCLS 111, Bloco C, Loja 22

 

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Linda juventude | Blog Clara Arreguy

Já fui entrevistada duas vezes pela professora e premiada escritora Margarida Patriota no programa “Autores e Livros”, que ela mantém há anos na Rádio Senado. Pessoa, além de brilhante, gentil e de um refinamento raro hoje em dia.

 

Acabo de ler dela o romance “Enquanto aurora – Momentos de uma infância brasileira” (7Letras, 2012), uma narrativa aparentemente juvenil, mas de uma poesia e uma profundidade que enganam à primeira vista.

 

A narradora do livro é a adolescente Maria, que nos conta, como quem não quer nada, as aventuras e desventuras dela e dos primos nas férias que compartilham em fazendas e praias pelo Brasil. Enquanto se divertem, os jovens aprendem, sofrem, crescem, cada qual com suas dificuldades. Uns são órfãos, outros têm irmão pequeno, outros anseiam por maior proximidade com a família.

 

A sexualidade latente, o amadurecimento acompanhado de alguma filosofia e muita poesia, a narrativa ao mesmo tempo contemporânea e aparentada de narrativas clássicas, a simpatia irresistível de Maria, sua avó, seus tios e primos, fazem de “Enquanto aurora” uma leitura simplesmente deliciosa, imperdível. E que bela edição!

 

Lições da infância | Tribuna do Norte (RN)

É comum que, na maturidade de seu ofício, o escritor volte os olhos para aquilo que constitui suas reminiscências da infância, e nem sempre por razões sentimentais ou mera nostalgia, como no Romantismo. Pela simples razão de que a infância, como a imaginamos na idade adulta, nem sempre se revela um oásis de boas lembranças; há nevoas de conflitos e sombras de crises, dúvidas, decepções e perdas. Como sucede, de resto, com as demais fases da vida. A diferença é que a infância reserva um nicho de descobertas e deslumbramentos que não têm correspondentes nas fases subsequentes.

Em seu novo livro, cujo título já sugere seu tema – “Enquanto Aurora – momentos de uma infância brasileira”, a escritora Margarida Patriota flagra um tempo em que sua vida transita da infância para a puberdade, fixando-se em duas estações de férias escolares, quando avó, primos e tios se reúnem primeiro numa fazenda, numa área rural do município mineiro de Três Pontes; depois, numa localidade urbana indeterminada da Bahia.

Autêntico rito de passagem, o livro contém elementos de suspense, como a existência de um quarto proibido na casa de fazenda cedida por uma amiga da família, e desperta entre os primos uma acirrada disputa: deve-se tentar violar o segredo do cadeado que tranca o compartimento misterioso? Esse tema ocupa uma parte considerável de “Enquanto Aurora”, mas serve também para introduzir traços primários de cada um dos jovens em férias, mais sensíveis, agora, ao apelo da aventura. Do mesmo modo, sugestivas pistas do despertar dos desejos são dadas, mas sem que a narradora se aprofunde nessa direção, talvez por ter em primeiro plano os leitores juvenis.

Outro traço marcante de “Enquanto Aurora” é o retrato da avó Dulce como elemento aglutinador do núcleo familiar da narradora Maria, na medida em que aparece como fator de equilíbrio e experiência no texto. Apesar disso, ela não consegue deter o processo de dispersão que acomete a família, pontuada por separações e defecções de membros, como, aliás, ocorre hoje com a família brasileira. Através do olhar de Maria, narradora em primeira pessoa, uma complexa gama de episódios e acontecimentos do mundo dos adultos aflora na narrativa, como a anunciar à autora que sua hora de folguedos e brincadeiras está prestes a ceder lugar a ocupações mais graves. Para isso, é suficiente que ela observe com mais atenção os modos de vida de seus tios Horácio e Júlio César. O primeiro, de vocação monástica, resignado à solidão; o segundo, um personagem dom-juanesco a que os vários rompimentos não parecem arrefecer a busca da companheira ideal ou idealizada. Quanto aos pais da narradora, têm um papel, por isso mesmo, secundário, e em nada interferem, revelando, com seu comportamento discreto, a significativa mudança que os diferencia da geração de seus próprios pais.

Transitando entre o mundo das crianças e o dos adultos, “Enquanto Aurora” pode ser fruído tanto por aqueles quanto por estes, sem que perca o frescor das narrativas juvenis. Não foi por acaso, portanto, que Margarida Patriota enveredou por outros gêneros narrativos, com igual êxito.

Vencedor do Prêmio Ganymédes José de Literatura Infantil-UBE/RJ, “Enquanto Aurora” é um dos vários títulos que Margarida Patriota escreveu no gênero infanto-juvenil, a exemplo de “Uma Voz do Outro Mundo”, “Tudo Muda com Duda”, “Meu Pai Vive de Arte”, “A Morte do Peixe-Vagalume”. A par disso, escreveu ensaios críticos, como “Modernidade e Vanguarda nas Artes”, “Vanguarda: do Conceito ao Texto”, “Para Compreender Raimundo Correia”, fruto de suas pesquisas como professora de Literatura Brasileira na Universidade Federal de Brasília.  Finalmente, enveredou com sucesso pela ficção com os livros “Brasília é uma Festa” e “Elas Por Elas”, contos em que discute questões prementes da modernidade, como as relações de gênero, as mudanças de comportamento da mulher, as crises da meia-idade, entre outras.


*Por Nelson Patriota,  escritor

Solidão e esquecimento | Jornal Rascunho

Por Cida Sepulveda*

Em A lenda de João, o assinalado, Margarida Patriota prima pelo rigor estético ao retratar a história de Cruz e Souza, homem sofrido e poeta marginalizado.

 

É uma narrativa linear (facilitadora da leitura), com uma linguagem exaustivamente lapidada. A prosa poética dá o tom ao mesmo tempo doce e pesado aos sonhos e frustrações do protagonista. As recorrentes tentativas de se firmar socialmente como escritor, a labuta pela sobrevivência e a exclusão, são elementos geradores de crescente desesperança. O leitor participa da angústia que emana do texto, sente-se aflito e impotente em relação à sucessão de fatos que comprovam, a todo instante, a crueldade de uma sociedade de castas.

 

Linguagens tradicionais e contemporâneas em suas diversidades são incorporadas à construção artesanal do texto — que resulta no estilo, ou seja, na peculiaridade da obra, na invenção de uma forma a partir de todas as formas existentes.

 

Lenda é narração. O texto de Margarida é uma mutação do gênero, pois, embora preserve a “narratividade”, acrescenta-lhe sensorialidade. Escrito com lamento e ternura, o texto comunga com o leitor a vida vivida e a sonhada de um dos maiores poetas brasileiros.

 

Com este trabalho, Margarida abraça o poeta e o pinta com cores van goghianas. Homenagem à altura do homenageado. É tudo que Cruz e Souza desejou: reconhecimento. A velha pergunta se repete: até quando hostilizaremos os poetas verdadeiros?

 

Um talento aflora

 

João é o único rebento de um casal de servos da família de um militar e fazendeiro da região sul do país, de Desterro, Santa Catarina. O casal patrão não tem filhos, e a jovem patroa cuida do garoto desde o nascimento, como uma segunda mãe.

 

Uma das razões que a aproxima dos servos é a solidão em que vive na Casa Grande, pelo fato de o marido estar participando da Guerra do Paraguai.

 

Já no primeiro capítulo são abordados os seguintes temas: política, sexualidade, maternidade e diferenças sociais, entre outros, como nesta passagem inicial: (…) Guilherme, na peleja defende a pátria de cujos privilégios os braçais são alijados, salvo o de morrer defendendo-a. “Que as castas caiam!”, pregaria fosse homem de calça e barba. Não fosse mulher, seria oradora de tribuna… Só que as castas existem. Por meio dos símbolos que as distinguem, formam pátrias dentro da pátria. “Tanto que migrar de uma casta para outra equivale a entrar em território estrangeiro…” A patroa ensina o garoto a ler e a escrever e o introduz no conhecimento da cultura da elite. Não há preocupação com datas, quantidades e fatos reais, apenas com a interpretação histórica voltada para o resgate da identidade de um ser humano cuja trajetória de vida foi marcada pela luta inglória.

 

O trágico é cotidiano: solidão literária, miséria e exclusão ferem gravemente um ser moldado para o intelecto e a poesia. A consciência da injustiça em relação ao seu talento aparece muito bem nesta passagem: “Poetas menos célebres proferem palestras concorridas, declamam para auditórios repletos. Alguns são pagos para escrever em jornais. Ele, que os jornais citam a três por dois, nenhuma academia quer ouvir…”

 

Resgate de um artista

 

Já rapaz, João perde o padrinho, que morre de repente. Isso ocasiona mudanças estruturais na vida dos que estão vinculados à fazenda. Resolve tentar a vida no Rio de Janeiro, mas encontra quase total rejeição por parte da elite intelectual e artística da cidade, com exceção de um pequeno grupo de cultores da poesia. Estes admiram o poeta e tentam ajudá-lo, inutilmente.

 

Casa-se com uma moça que se torna sua grande companheira de toda a vida. Juntos, enfrentam a pobreza e a discriminação social. A prole cresce e João, profissionalmente, mantém-se estagnado num emprego que não lhe dá visibilidade nem dinheiro.

 

Para agravar a tragédia cotidiana, sua esposa adoece repentinamente. João passa a ter uma rotina estafante. Além do trabalho regular, cuidará da casa, dos filhos e da mulher acometida por um mal psiquiátrico.

 

Depois de longo período em estado de demência, ela, da mesma maneira que perdeu a lucidez, volta ao normal. Em seguida, João contrai tuberculose e, embora os amigos juntem dinheiro para interná-lo num sanatório, isso não chega a acontecer.

 

Enfim, paupérrimo e desesperado, experimenta os horrores da miséria, da loucura e da tuberculose, sem parar de escrever. Entre os que esmolaram a seu favor, o colunista de O país, Artur Azevedo, escreve: Não estou no catálogo de seus amigos, nunca troquei uma palavra com ele, conheço-o apenas pelos seus escritos; não me compete, pois, tomar a iniciativa de um movimento qualquer em seu favor. Mas isso não obsta a que me ponha desde já ao serviço de todas as pessoas que, por meu intermédio, desejarem de qualquer modo manifestar a sua simpatia pelo autor…

 

A lenda de João, o assinalado é um livro sério. O narrador, despojado de vaidades, resgata o artista silenciado pelo tempo e pela solidão literária, condição da maioria dos verdadeiros artistas, vivos ou mortos.

 


*É escritora e professora. Autora de Coração marginal, entre outros. Vive em Campinas (SP).

Ler na íntegra: Jornal Rascunho